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RUY CASTRO
O tatu ataca
RIO DE JANEIRO - À falta do Nobel, o IgNobel. Dois cientistas brasileiros foram contemplados com o
prêmio conferido anualmente pela
revista americana "Annals of Improbable Research", que contempla
"trabalhos científicos que primeiro
fazem rir e, depois, pensar". O IgNobel é distribuído na mesma época que o Nobel, mas sem tanto alarde. Só lhe farão justiça se alguém
ganhar os dois no mesmo ano.
Mas, enfim, Astolfo Mello Araújo
e José Carlos Marcelino, da USP, levaram o IgNobel de Biologia por
sua tese sobre como "o curso da história ou, pelo menos, o conteúdo
das escavações em um sítio arqueológico pode ser remexido pelas
ações de um tatu vivo". Não ria. O
assunto é mais sério do que parece.
Um tatu pode fazer misérias debaixo da terra, como deslocar um
caco de vaso etrusco enterrado há
3.000 anos, a 12 metros de profundidade, e situá-lo ao lado de um urinol florentino do século 15 e de um
LP de Rita Pavone de 1964 -e trazer tudo isso à flor da terra ao mesmo tempo, enlouquecendo os arqueólogos. Tatus, como se sabe, são
bichos sem muito rigor histórico e,
para eles, tanto faz que as camadas
da terra virem uma farofa sem pé
nem cabeça.
Astolfo e José Carlos chegaram à
sua conclusão simulando um sítio
arqueológico no zôo de São Paulo,
usando tatus ali residentes. De repente, nem eles se entendiam: por
mais absurdo, um par de suspensórios de Menotti Del Picchia, de
1919, coabitava no mesmo buraco
com um pé de chuteira do palmeirense Waldemar Carabina, de 1957,
e com a agenda telefônica de Bruna
Surfistinha, de 2004, como se fosse
tudo de uma época só.
É também a sensação que tenho
ao ler festejados livros de memórias, publicados entre nós recentemente. Um tatu passou por aquelas
páginas e misturou anos, décadas,
até séculos.
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