São Paulo, domingo, 17 de maio de 2009

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Comércio e Justiça voltam à vida no Haiti

Fim de confrontos entre rebeldes e efetivo da ONU trouxe clima de maior estabilidade ao país, que agora planeja reformas

População haitiana ganhou coragem para denunciar integrantes de gangues, aponta o coordenador de um projeto de segurança

LUIS KAWAGUTI
EM PORTO PRÍNCIPE

Sem confrontos entre rebeldes e militares das Nações Unidas há dois anos e 15 dias, o Haiti assiste atualmente a um ressurgimento do Poder Judiciário, do comércio de rua e da rede elétrica, além do início de uma reforma carcerária.
No auge dos combates no país, em 2005, os 1.200 militares brasileiros responsáveis pela segurança na capital Porto Príncipe chegaram a entrar em combate contra rebeldes chimères 111 vezes em seis meses, o que dá a média de quase dois confrontos a cada três dias.
A tropa brasileira chegou a disparar 49,6 mil tiros (somente em combate) em cerca de 180 dias. Hoje, às vésperas do aniversário de cinco anos do início da missão, é comum encontrar soldados que chegaram ao Haiti e, em cinco meses de missão, não usaram nem uma munição do carregador do fuzil. As tropas brasileiras são substituídas a cada seis meses.
Durante toda a missão, 25 militares morreram, sendo 3 deles brasileiros (dois em acidentes e um suicídio). Entre os funcionários civis da ONU, as mortes somaram 19.
Em meados de 2005, os capacetes azuis só conseguiam entrar nos bairros de Bel Air e Citè Soleil (redutos rebeldes) em veículos blindados e sempre eram recebidos a tiros.
Hoje, a primeira coisa que se nota na capital é a ausência desses blindados, que agora só circulam à noite em áreas específicas. A maior parte do patrulhamento é feito por tropas em jipes ou a pé, para não intimidar a população.

Vida noturna
Diferentemente de cinco anos atrás, há grande movimento de veículos civis durante a noite. Em um giro rápido de carro é possível encontrar barreiras da polícia nacional nas principais ruas.
A cidade, que vivia permanentemente sem luz, agora tem energia elétrica na maioria dos bairros entre o início da manhã e as 19h. Lojas funcionam em construções de alvenaria, e até supermercados podem ser encontrados na cidade. Quando a Minustah (Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti) teve início, o comércio era realizado quase que apenas em barracas de madeira semelhantes às dos camelôs.
Um mercado em ruínas no centro de Citè Soleil -transformado em bastião da ONU para a tomada militar da região em 2006- é hoje uma espécie de símbolo da propaganda da pacificação do país. Ele foi reformado com verba norte-americana e transformado em delegacia. Além disso, o bairro teve mais ruas asfaltadas e sua iluminação pública instalada.
As últimas facções rebeldes que lutavam em Porto Príncipe foram desbaratadas por operações militares da ONU em abril de 2007.
"Ainda há membros de gangues em Bel Air e Citè Soleil, mas são muito poucos e só agem de noite. A grande diferença é que hoje a comunidade tem coragem de procurar a polícia e denunciar", disse Mantinard Robert, coordenador de um projeto de segurança comunitária em Bel Air promovido pela organização não governamental brasileira Viva Rio.

Reformas
Segundo a ONU, porém, a continuidade da paz depende de dois fatores: o treinamento de um efetivo de 14 mil policiais nativos -previsto para terminar até 2011- e a reestruturação dos sistemas judiciário e prisional do país.
"A reforma do Judiciário é mais complexa que a da polícia. Temos um plano para que ela seja concluída entre três e cinco anos", disse Luiz Carlos da Costa, representante-adjunto no Haiti do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon.
Segundo Costa, os primeiros passos já foram dados com a aprovação de três leis, que tornam o Judiciário independente do Executivo. Elas estabelecem a criação de carreiras de magistrados, de um tribunal superior e o estabelecimento de um processo de fiscalização das atividades judiciárias.
Além disso, neste ano, a escola de magistratura -fechada desde a queda do ex-presidente René Préval- foi reativada. A meta da ONU é criar 160 novas cortes e formar mais 350 juízes.
O sistema carcerário, em contrapartida, teve poucos avanços. Embora todos os presos políticos tenham sido libertados, a superlotação das cadeias fere padrões internacionais de direitos humanos.
Segundo relatório das Nações Unidas, cada um dos 8,2 mil presos dispõe hoje de 0,6 metros quadrados de área nas 17 prisões do país. O mínimo estipulado pela organização é 2,5. Para diminuir o problema, uma nova penitenciária com mais 750 vagas está sendo construída.


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