São Paulo, sexta-feira, 27 de março de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

KARL-THEODOR ZU GUTTENBERG

Uma nova era de capitalismo responsável


É preciso focar medidas que reforcem o crescimento em longo prazo e que mantenham a responsabilidade fiscal


A CRISE está aparentemente varrendo do cenário ideias estabelecidas sobre como as sociedades deveriam gerir suas economias. Na Alemanha, a crise se ampliou até se tornar a pior recessão do pós-guerra. O diagnóstico que alguns oferecem é que estamos observando o fim do mundo financeiro que um dia conhecemos. Não muito tempo atrás, havia quem alardeasse a era de Alan Greenspan como a concretização de novo paradigma econômico.
Há quem apele pela retomada do capitalismo de monopólios estatais, ocasionalmente definido como "novo capitalismo". A crise deve ter impacto catártico sobre o setor financeiro, mas há o risco de que as respostas sejam exageradas.
Tanto para administrar a crise em curto prazo como em suas decisões de longo prazo, é imperativo que se compreenda o que aconteceu de errado com a economia mundial. Alguns elementos da formação das bolhas habitacional e financeira foram identificados com clareza: políticas monetárias frouxas; incentivos incorretos no mercado da habitação; falta de regulamentação sobre as instituições financeiras, o que permitiu a criação de um sistema bancário paralelo; sistemas inadequados de incentivo e de administração de riscos, nos bancos; e o fracasso das agências de classificação de crédito e da fiscalização dos mercados.
À medida que as bolhas estouravam, e que a crise do mercado financeiro se estendia à economia real, BCs e governos adotaram medidas para restaurar a confiança nos mercados e mitigar a recessão. É essencial que o foco esteja em medidas que reforcem o crescimento em longo prazo e que mantenham a responsabilidade fiscal. Os pacotes de estímulo alemães -os maiores da UE- combinaram gastos adicionais do governo com a infraestrutura a reduções em impostos e contribuições sociais. Ao mesmo tempo, o governo federal concordou em tornar mais rígidas as regras quanto a déficits, que são parte de nossa Constituição, a fim de garantir a sustentabilidade das finanças públicas.
É vital que a crise não se torne uma forma de encobrir medidas protecionistas e intervencionistas casuais, ou, pior, que conduza a uma espiral de intervenções ou a uma retomada plena da planejamento governamental de política industrial. Portanto, todas as medidas de estímulo devem no mínimo ser não discriminatórias e respeitar as regras.
Os governos precisam trabalhar agora para a redução do risco sistêmico do sistema financeiro, sem necessariamente restringir a inovação financeira. Uma forma de fazê-lo seria reformar as regras para o setor.
Três princípios devem orientar essa reforma: primeiro, a administração de riscos nos bancos e a fiscalização de riscos pelas agências de classificação de crédito e autoridades financeiras precisa ser reforçada a fim de impedir o acúmulo de riscos sistêmicos. Segundo, a fim de prevenir o crescimento do risco moral, é preciso haver um plano para o tratamento de bancos relevantes e em risco de quebrar que garanta que os executivos e os investidores arquem com a maior parte da responsabilidade. Terceiro, as regras precisarão tentar cobrir todos os agentes sistêmicos do setor financeiro e evitar lacunas na regulamentação.
Crises polarizam o debate político. Usar o dinheiro dos contribuintes para salvar bancos cujos executivos recebem bonificações, e ao mesmo tempo permitir a quebra de outras vítimas da crise na economia real, será uma decisão que os políticos enfrentarão dificuldades para explicar. Explicar a política econômica, encontrar soluções de longo prazo confiáveis e oferecer oportunidades econômicas iguais aos cidadãos são precondições para o bom futuro das economias de mercado, tanto em suas variantes anglo-saxãs quanto nas continentais europeias.

KARL-THEODOR ZU GUTTENBERG é ministro da Economia da Alemanha. Este artigo foi publicado originalmente no "Financial Times".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

Excepcionalmente, hoje, a coluna de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não é publicada.



Texto Anterior: Empresária vai para prisão considerada reduto do PCC
Próximo Texto: BC facilita crédito para bancos menores
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.