Punição a corruptos tem apenas valor simbólico, diz pesquisadora
Doutora em direito e professora na Universidade de Toronto, a brasileira Mariana Mota Prado diz que episódios recentes de punição contra corruptos --como o caso do mensalão- têm apenas valor "simbólico", pois não são acompanhados por mudanças efetivas na Justiça "lenta e formalista" do Brasil.
Ela defende a criação de uma "justiça anticorrupção" no país, nos moldes da Justiça do Trabalho ou Eleitoral, para acelerar punições a empresas e agentes corruptos.
"Há monitoramento e investigação. É no Judiciário que a coisa está parando", comenta Prado, que integra a direção da ONG Transparência Internacional no Canadá.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
Mauro Frasson-05.nov.2013/Agenciafiep | ||
A advogada Mariana Mota Prado diz que punição contra corruptos tem apenas valor "simbólico" |
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Folha - Julgamentos recentes no Brasil puniram políticos por corrupção, como os réus do mensalão e o deputado Natan Donadon. Isso representa um avanço?
Mariana Mota Prado - A pergunta é: qual o percentual de pessoas que se engajaram em corrupção que essas condenações representam? O mensalão é um caso. Se é exceção da regra, não resolve o problema. E ainda tem a discussão de que o mensalão foi decidido como foi por pressão popular. Aí o valor simbólico é ainda maior e a possibilidade de mudar o problema estrutural, menor.
Esses casos não indicam mudança estrutural, têm valor simbólico.
Por que a sra. defende uma reforma do Judiciário no Brasil
Hoje, basicamente, a aplicação da lei contra a corrupção tem três passos: monitoramento, investigação e punição. No nível do monitoramento, há a CGU (Controladoria-Geral da União), o TCU (Tribunal de Contas da União), ONGs, imprensa. Todos supervisionando e coletando informação. Depois, entram órgãos de investigação: CPIs, Ministério Público, Polícia Federal.
Passou o período da investigação, chega no Judiciário. Quem mais está fazendo isso? Ninguém mais. Nos outros níveis, existe competição institucional. Se a imprensa não pegou, a ONG, CGU ou TCU pegam. Na investigação, se a PF não investiga, o Ministério Público investiga, a CPI. Na punição, não tem. Se o Judiciário não faz o trabalho, não há para onde correr.
Mas qual é a saída?
A minha proposta é criar competição institucional no nível da punição, com a criação de um tribunal especial anticorrupção.
A gente tem Justiça Eleitoral, trabalhista, por que não criamos uma justiça anticorrupção? Ou pelo menos câmaras especializadas nos tribunais. Muitos dizem que não há punição porque o problema está na investigação mal feita. Todos os estudos que li sobre isso dizem que não é o caso que chega capenga ao Judiciário. Tem muito recurso, a Justiça é muito lenta e formalista.
O governo aprovou em agosto a lei anticorrupção empresarial, que prevê punição de empresas por atos contra a administração pública. É um bom caminho?
O Brasil tem legislação para dar e vender. A Global Integrity, ONG que avalia a legislação anticorrupção no mundo, deu nota máxima para o país em 2009. A legislação está completa. Está faltando a aplicação.
Recentemente, grandes empresas delataram atos de corrupção às autoridades no Brasil. Você acha que novos casos virão? Ou ainda é um comportamento inibido?
No Brasil ainda se tem uma visão muito moralista da corrupção. Ou você nasce corrupto, ou nasce honesto. Isso tende a personalizar muito o problema.
O que determina se predomina um ou outro não é o berço, são os incentivos. Incentivos institucionais, das empresas ou dos governos, aumentam ou diminuem a corrupção. O benefício da lei anticorrupção é que ela cria mecanismos não voluntários para isso. A multa para quem se envolve em atos contra a administração pública é de até 20% do faturamento. É altíssima. A empresa vai pensar: "Vou correr o risco ou implementar um sistema de compliance [conformidade às leis e combate à corrupção]?". A lei é um incentivo.
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