Análise: Mudança na ordem da globalização
Não faz muito tempo, executivos da multinacional holandesa Royal DSM, que produz suplementos nutricionais e materiais de alta tecnologia, exigiam uma bateria de estudos internos para decidir onde fechar um negócio ou situar uma nova fábrica.
Hoje, porém, "nem vamos fazer o estudo", disse Stephan B. Tanda, responsável pelas Américas. "Está claro que a nova fábrica será criada nos Estados Unidos."
Os EUA, disse Tanda, tem gás natural barato e um mercado de trabalho muito pouco regulado. Ao mesmo tempo, a China, onde a Royal DSM tem 40 fábricas, está perdendo suas vantagens.
"A China está menos atraente do que antes como fonte da qual fornecer ao mundo", disse Tanda. Dos US$ 3,6 bilhões (R$ 8,9 bilhões) em aquisições feitas pela Royal DSM desde 2010, 80% foram nos Estados Unidos. Será que a globalização vai dar meia-volta?
Nos últimos dois anos, cada vez mais analistas vêm argumentando que estamos entrando em uma nova era de manufatura global, tendo os EUA ao centro.
No mês passado o Boston Consulting Group, uma firma de consultoria, disse que os Estados Unidos tem os custos de manufatura mais baixos entre os principais países exportadores do mundo desenvolvido e está quase tão competitivo quanto a China.
"Não concordo que o momento da China esteja chegando ao fim", opinou Karl P. Sauvant, do Centro Columbia de Desenvolvimento Sustentável. "O determinante mais importante do investimento é o tamanho e o crescimento do mercado. A China continua a ser um mercado grande e continua a crescer em ritmo razoável."
Qual é o problema se os trabalhadores das regiões costeiras da China estão ficando mais caros? O país produzirá bens mais sofisticados. Na verdade, quando suas receitas convergem os países tendem a comerciar mais, não menos.
As empresas manufatureiras que buscam mão-de-obra barata ainda têm muitos lugares onde procurar, como Vietnã, Bangladesh, México ou até o densamente povoado interior da China, que vai beneficiar-se dos enormes investimentos em infraestrutura feitos por Pequim para ligá-lo ao litoral.
Existem dinâmicas que podem prejudicar seriamente a globalização. Se os preços da energia voltarem a decolar, isso vai favorecer as redes de produção regionais.
A pirataria intelectual na China pode reduzir o interesse das multinacionais em investir em indústrias avançadas no país.
Tecnologias que permitem que menos funcionários façam tarefas mais sofisticadas -por exemplo, a impressão 3D- podem incentivar a produção em países ricos, perto dos mercados de consumo.
O crescimento mais lento já está enfraquecendo os argumentos em favor dos mercados abertos, dos quais a globalização depende.
Desde a Grande Recessão, o comércio se reduziu muito. As medidas protecionistas se multiplicaram, à medida que os países buscaram proteger seus produtores.
Talvez os custos crescentes na China possam finalmente trazer um alívio aos trabalhadores americanos, que há 20 anos perdem terreno para o pool antes infinito de chineses de baixo custo.
Mesmo assim, Richard Baldwin, do Instituto Graduado de Estudos Internacionais e do Desenvolvimento, em Genebra, disse que a convergência de renda movida pela industrialização acelerada da China e em alguns outros países, como Brasil e Índia, não deve parar no futuro próximo.
Em 1988, a parcela da receita mundial dominada pelos países mais ricos chegou ao auge, em dois terços. Em 2010, tinha caído para metade. Para Baldwin, ela deve continuar a cair.
É difícil encontrar dados que evidenciem a possibilidade de a globalização estar voltando atrás. Os fluxos de investimentos estrangeiros diretos no mundo continuam substancialmente abaixo do recorde de US$ 2 trilhões (R$ 4,96 trilhões) marcado em 2007.
Mas em 2013 eles subiram 9%, para US$ 1,45 trilhões (R$ 3,6 trilhões), segundo dados da ONU. Mais de metade deles foram para países em desenvolvimento, e a China recebeu US$ 124 bilhões (R$ 308 bilhões), quase um recorde e 50% mais que seis anos atrás.
Mesmo que os Estados Unidos atraiam uma parcela maior da manufatura global, é pouco provável que esse movimento traga muitos empregos bem pagos.
James B. Rice Jr. e Francesco Stefanelli, do Massachusetts Institute of Technology, analisaram 50 empresas que disseram estar trazendo empregos de volta. A maioria não tomou nenhuma medida. Rice disse: "Não achamos que isso ocorra de fato".
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