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MARINA SILVA
O besouro é nosso
LI, NA SEMANA passada, duas
notícias que contam como
nossas riquezas naturais continuam sendo ignoradas por nós e
apropriadas por outras nações. A
primeira dizia que em março o Museu de História Natural de Genebra
divulgou sua nova aquisição: o Titanus gigantus, o maior inseto do
mundo, conhecido como besouro
gigante da Amazônia.
Seu tamanho
impressiona -é maior que a mão
de um adulto- e certamente fará
sucesso entre os visitantes. De
acordo com o museu, acredite-se
ou não, o besouro teria "viajado por
engano na mala de um turista suíço". Assustado, ele teria chamado
uma empresa de dedetização, que
encaminhou o espécime ao museu.
Outro besouro brasileiro também vem fazendo sucesso, nos Estados Unidos. Pesquisadores da
Universidade de Utah acreditam
ter encontrado o cristal fotônico
ideal na carapaça do besouro Lamprocyphus augustus.
Esse cristal é essencial para a
construção de circuitos eletrônicos
que manipulem dados por meio de
luz (fótons), em vez de cargas elétricas (elétrons).
E o curioso é que
os cientistas americanos não tiveram trabalho para conseguir o inseto brasileiro. Encomendaram-no a um vendedor da Bélgica, pela
internet. Não duvido que, apenas
com a tecnologia decorrente das
pesquisas com este único besouro,
os americanos produzam mais riqueza do que todo o valor anual da
exploração ilegal de madeira, da
soja e do gado na Amazônia.
Temos a maior porção da maior
floresta tropical do planeta. É um
tesouro em biodiversidade que
precisa ser cuidado e explorado pelo Brasil. Em 2006, o Tribunal de
Contas da União (TCU) apontou a
falta de controle nas fronteiras como razão da perda anual de US$ 2,4
bilhões, com a saída de animais e
plantas que acabam por gerar produtos patenteados no exterior.
São muitas as ameaças à biodiversidade brasileira: biopirataria,
aquecimento global, desmatamento, tráfico de animais, superexploração de espécies. E a mais terrível
parece ser a nossa inoperância
diante disso tudo.
Em 1994, o Brasil ratificou a
Convenção da Biodiversidade Biológica. Em 1995, apresentei proposta no Senado para disciplinar o
acesso aos recursos genéticos no
país. O projeto (PL 4.842) foi à Camara dos Deputados em 1998 e lá
está até hoje. Outra tentativa foi
feita em 2003, por meio do Ministério do Meio Ambiente.
Nova proposta foi negociada por
mais de cinco anos, com todos os
setores interessados. Novamente
deu em nada. Continuamos sem
regras. E todo o conhecimento gerado pela biodiversidade continuará sendo apropriado por quem chegar primeiro, sem gerar dividendos
para o país.
contatomarinasilva@uol.com.br
MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.
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