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MARCOS NOBRE
Discutindo a relação
JÁ HÁ ALGUM TEMPO a política
anda com fumaças amorosas.
Dizem que um partido "ficou"
com o outro, depois se resolveu por
um namoro firme. Graças a uma
Constituição avançada, há partidos
vivendo em união estável, alguns
porque a família não quer o casamento. Quem casa de papel passado teme cartas anônimas com acusações de adultério, reais ou imaginárias.
A volubilidade chegou a seu auge
nas negociações para as próximas
eleições municipais. Alianças eleitorais mudaram de um dia para outro, partidos adversários se juntaram em muitas cidades, aliados
históricos resolveram "discutir a
relação" e "dar um tempo". É quando volta o desejo ordenador de uma
reforma política.
Receitas de reforma há muitas.
Todas têm em comum o desejo de
coerência, a idéia de que a lei deve
produzir partidos "fortes" e "ideológicos".
Mas é difícil saber o que isso quer
dizer ao certo. A impressão é a de
que se deveria fazer uma cópia da
imagem que se tem por aqui de
partidos alemães, ingleses, norte-americanos.
Não é nada fácil uma transposição como essa. Na Alemanha, por
exemplo, tem-se hoje a chamada
"grande coalizão", em que convivem no mesmo governo os dois
maiores adversários políticos. Se
fôssemos traduzir hoje, daria algo
como casar e ir morar na casa da
sogra.
Veja-se o exemplo do PT. Na luta
selvagem da década de 1980, ficou
em boa medida à margem da política institucional, mas trouxe para o
debate público temas e teses inovadores. Na década de 1990, entrou
com tudo na lógica eleitoral, sustentando a organização do sistema
político em dois pólos. Ocorreu,
porém, que o "Lulinha paz e amor"
tornou a polarização bem menos
nítida e abriu as portas para um sistema político casamenteiro.
Na melhor das hipóteses, a década de 2000 será lembrada como
um momento de transição. O governo Lula desequilibrou um sistema político assentado precariamente em dois pólos para conseguir se manter no poder, assolado
por sucessivos escândalos e por
uma frágil sustentação no Congresso. Segurou-se nas políticas sociais e em um surto de crescimento
econômico como há muito não se
via.
Não há reforma política capaz de
dar conta da situação atual. Não se
sabe ao certo o que está acontecendo, muito menos aonde vai dar tudo isso. Enquanto não for possível
vislumbrar a possibilidade de um
novo equilíbrio para o sistema político, o mais prudente mesmo é
prestar muita atenção e tentar produzir o melhor debate possível.
Quando a política vira briga de casal, não há colher que não seja torta.
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta
coluna.
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