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LUIZ FERNANDO VIANNA
A tristeza era senhora
RIO DE JANEIRO - Já se disse que a
Copa do Mundo é um evento feminino. Homem gosta mesmo é de
Bonsucesso x Quissamã, poderia
escrever Xico Sá.
Mulheres que passam quatro
anos vendo reprises de séries americanas, enquanto os pares se descabelam no pay per view, agora
põem camisa amarela, arquinho
verde e sopram as vuvuzelas.
Há na Copa um ambiente afeito a
ansiedades, angústia, até histeria.
Ao saírem dos locais de trabalho
para assistir aos jogos, as pessoas
parecem, como diz uma amiga, correr para um bunker que as proteja
do iminente ataque nuclear.
E, apesar de o manual do politicamente correto não simpatizar
com outros manuais, nem os de psicanálise, é conhecida a associação
entre mulheres e histeria. Sem a
maciça adesão feminina, a euforia
bissexta não seria a mesma.
A Copa permite que diatribes
conjugais, parricídios em potencial
e incompatibilidades diversas se
tornem um grito coletivo, único. É,
sem ironia, a feliz histeria nacional.
Esse bendito junho/julho quadrienal nos leva a pensar em aspectos que não têm relação direta com
o futebol. Por exemplo: por que a
hegemonia na música de hoje está
com o pop dançante, o rap e os sons
eletrônicos? Porque eles favorecem
o suor, a taquicardia, as alterações
do corpo, sem muita necessidade
de concentração -exceto o segmento político do rap, que não é o
hegemônico no mundo.
Eles são a correspondência em
forma de música da ansiedade, da
angústia e da histeria desses tempos incansavelmente velozes. As
baladas tristes, as "torch songs", as
chamadas canções de fossa, os
sambas de notas alongadas, tudo
isso soa deslocado numa época em
que só se corre para os lados, como
baratas envenenadas, e não se
aprofundam as dores.
A tristeza já foi senhora respeitada, hoje é motivo de galhofa. Haja
coração!
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