São Paulo, quinta-feira, 01 de julho de 2010

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LUIZ FERNANDO VIANNA

A tristeza era senhora

RIO DE JANEIRO - Já se disse que a Copa do Mundo é um evento feminino. Homem gosta mesmo é de Bonsucesso x Quissamã, poderia escrever Xico Sá.
Mulheres que passam quatro anos vendo reprises de séries americanas, enquanto os pares se descabelam no pay per view, agora põem camisa amarela, arquinho verde e sopram as vuvuzelas.
Há na Copa um ambiente afeito a ansiedades, angústia, até histeria. Ao saírem dos locais de trabalho para assistir aos jogos, as pessoas parecem, como diz uma amiga, correr para um bunker que as proteja do iminente ataque nuclear.
E, apesar de o manual do politicamente correto não simpatizar com outros manuais, nem os de psicanálise, é conhecida a associação entre mulheres e histeria. Sem a maciça adesão feminina, a euforia bissexta não seria a mesma.
A Copa permite que diatribes conjugais, parricídios em potencial e incompatibilidades diversas se tornem um grito coletivo, único. É, sem ironia, a feliz histeria nacional.
Esse bendito junho/julho quadrienal nos leva a pensar em aspectos que não têm relação direta com o futebol. Por exemplo: por que a hegemonia na música de hoje está com o pop dançante, o rap e os sons eletrônicos? Porque eles favorecem o suor, a taquicardia, as alterações do corpo, sem muita necessidade de concentração -exceto o segmento político do rap, que não é o hegemônico no mundo.
Eles são a correspondência em forma de música da ansiedade, da angústia e da histeria desses tempos incansavelmente velozes. As baladas tristes, as "torch songs", as chamadas canções de fossa, os sambas de notas alongadas, tudo isso soa deslocado numa época em que só se corre para os lados, como baratas envenenadas, e não se aprofundam as dores.
A tristeza já foi senhora respeitada, hoje é motivo de galhofa. Haja coração!


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