São Paulo, segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

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Inflação alta e petróleo em baixa assombram iranianos

Pobreza e desemprego ofuscam abertura política como maior preocupação no Irã

Sem diversidade, economia é minada por dependência de importações e sanções; com crise, peso de subsídios e arrecadação baixa cresce


RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL A TEERÃ

Nas antiquadas lojas de departamentos da capital iraniana, onde não existem supermercados, os clientes fazem estoque de mercadorias em seus carrinhos.
A inflação oficial bateu 25,2% no último ano, mas os preços de alguns produtos da cesta básica subiram 45%.
O desemprego oficial é 11%, mas acredita-se que seja quase o dobro. Uma pesquisa da rede britânica BBC no final do ano passado revelou que para 45% dos iranianos, o desemprego e a pobreza são a maior preocupação. Democracia ou abertura política foram citadas por apenas 1% dos entrevistados.
Mas, para vários economistas no país ouvidos pela Folha, o pior está por vir, graças à queda dos preços internacionais do petróleo.
Cerca de 80% da economia iraniana está nas mãos do Estado e mais de 50% do Orçamento vem da exportação de petróleo -os preços do produto despencaram no último semestre.
A mesa iraniana é servida com importados. Da carne de cordeiro à de frango, passando por arroz, tomate e manteiga, presentes em qualquer kebab que se preze, tudo é importado. Só 8% do montanhoso e árido território nacional é cultivado.

Sem impostos
Repressivo nos costumes, o governo é generoso na hora de cobrar impostos e oferecer subsídios. Para compensar o preço dos importados, subsidia 70% da eletricidade, gás e até a gasolina (quem tem carro popular, paga cerca de R$ 0,23 por litro).
Os gastos públicos cresceram enquanto o preço do barril de petróleo estava perto de US$ 100. O Irã investiu com vontade em seu programa nuclear e exibe avanços militares e tecnológicos, como o lançamento de um satélite de fabricação própria no último dia 3.
Mas agora o preço do produto caiu a menos da metade, por volta de US$ 45 o barril. O FMI (Fundo Monetário Internacional) disse que o país sofrerá "déficits insustentáveis" com o barril a menos de US$ 75.
Apenas funcionários públicos e empregados de algumas grandes empresas pagam imposto de renda. No ano passado, foi criado um imposto de valor agregado como o brasileiro ICMS, com alíquota de apenas 3%. Mas a recepção dos comerciantes dos bazares - pouco habituados a taxas- com protestos e passeatas fez com que o governo acabasse adiando a cobrança.
"Perdemos 40% das vendas de um ano para outro, por causa da inflação, e agora querem cobrar impostos", reclamou à Folha Muhammad Haidar, vendedor no Grande Bazar de Teerã há 30 anos.
De olho nas eleições gerais em junho, ninguém acredita que o presidente conservador Mahmoud Ahmadinejad vá cortar subsídios ou grandes gastos de infraestrutura. Se emitir dinheiro, a inflação se descontrolará de vez.
No governo anterior, do reformista Mohammad Khatami, foi criado um fundo contingencial do petróleo, que, na prática, poupava parte dos lucros com as exportações para épocas de vacas magras. Por enquanto, é esse fundo que deve ser usado pelo governo.

Importando gasolina
Como outros países que são grandes produtores do óleo, a economia iraniana tem diversidade quase zero.
O Irã é o quarto maior produtor de petróleo do mundo e possui a segunda maior reserva conhecida do produto, mas precisa importar 40% do combustível que consome. Desde a chegada ao poder dos aiatolás, há exatos 30 anos, nenhuma refinaria é construída.
Dono da segunda maior reserva de gás, também precisa importar o produto para abastecer os sistemas de calefação no frio inverno, que só agora termina no hemisfério norte.
O país importa trigo dos Estados Unidos, mas, por conta das sanções comerciais, esse trigo ganha nova etiqueta de origem por terceiros em Dubai, Suíça e Austrália. E os preços só encarecem.
O Irã está fora do sistema bancário internacional, então letras de crédito iranianas não são aceitas fora (e, pesadelo para os poucos turistas, cartões de créditos internacionais não servem no país).
Boa parte da crise iraniana é política, admite um economista com bom trânsito no governo. Das sanções comerciais ao discurso de pária do governo ultraconservador, o investimento estrangeiro no país é mínimo, inclusive em seu grande capital, o petróleo.


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