São Paulo, terça-feira, 05 de abril de 2011

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NIZAN GUANAES

A mesa


Em vez de reuniões em palácios, temos de nos reunir no Google, no Louvre, no tapete do Oscar


FAÇO parte do Alto Comissariado da ONU para o combate à Aids. Somos 12 membros: o bispo sul-africano e Nobel da Paz, Desmond Tutu, o astro de basquete americano Magic Johnson, Chris Hughes, um dos fundadores do Facebook, o líder egípcio Mohammed El Baradei e os ex-presidentes Jacques Chirac (França) e Michelle Bachelet (Chile), para citar alguns.
Fui chamado para ser comissário justamente para atuar na comunicação, e por isso mesmo estou lutando para que as reuniões do nosso grupo sejam mais midiáticas, provoquem mais conteúdos e sejam menos burocráticas.
Elas têm que ser feitas em lugares que chamem a atenção do mundo. O problema da Aids hoje é fácil de entender, mas complexo de resolver.
Ela deixou de ser uma doença necessariamente terminal. No mundo rico, o tratamento é doloroso e custoso, mas o sujeito vive com ela. Só que no lado pobre do mundo, e o lado pobre do mundo é imenso, as pessoas ainda morrem.
Se já é difícil viver miseravelmente, ainda que com saúde, imagine enfrentar a miséria sofrendo com a Aids. E os governos dos países mais castigados não têm dinheiro para financiar o custoso tratamento nem organização para dar capilaridade a ele.
No entanto, no mundo rico a Aids "saiu de moda" e da mídia, saiu da pauta das pessoas.
Isso gera dois problemas graves: o relaxamento das campanhas de prevenção, que torna as pessoas menos vigilantes e atentas, e a redução do empenho financeiro de governos e entidades, fundamental para os necessários avanços científicos contra a doença e para a sua prevenção. Sobretudo num momento de crise mundial, em que todo mundo está cortando verbas.
Se a voz e o clamor da opinião pública arrefecem, os ouvidos dos governantes globais se fecham aos apelos por ações e doações. A ONU, por sua vez, é um mar de boas intenções, mas o mundo é grande, as mazelas são muitas, e o cobertor é curto.
O mundo é lembrado todos os dias do que a ONU não faz porque a ONU não tem sido eficiente em mostrar ao mundo tudo o que ela e seus órgãos como Unesco, Unicef, Unaids e Acnur fazem todos os dias.
Há milhares e milhares de homens e mulheres nos quadros da ONU como o brasileiro Sergio Vieira de Mello, que deram, dão e darão a vida por um mundo melhor.
O papel do Alto Comissariado da Aids é chamar a atenção para essa doença que mistura fome, desnutrição e miséria. Portanto, nosso trabalho deve ser simples em vez de burocrático. Ele tem que ser midiático e rápido.
Em vez de reuniões em palácios, temos de nos reunir no Google, no Carrossel do Louvre, no tapete vermelho do Oscar, na Bienal de Veneza. Temos de usar as redes sociais.
Eric Schmidt, chairman do Google, disse na abertura da Clinton Global Initiative que a mobilidade será o fator que mais poderá ajudar na mobilização das causas sociais.
O celular já é usado ativamente na África em programas de prevenção e de controle de doenças.
A mídia é uma grande parceira, sempre disponível, aberta e engajada. Ela só precisa ser alimentada com fatos, gestos e fotos. É por isso que nos próximos dias 2 e 3 de maio estaremos nos reunindo em Robben Island, onde ficou preso o grande Nelson Mandela. Afinal, Aids é prisão e apartheid social.
No pátio da prisão onde Mandela ficou preso, será colocada uma mesa de 12 lugares. E faremos nossa reunião a céu aberto, a ser transmitida para as principais emissoras do mundo e, sobretudo, pela internet.
Depois disso, espero marcar a próxima reunião na sede do Google, em Palo Alto (Califórnia), e assim por diante.
O que a Aids precisa agora é de "awareness", de voz. E eu acredito que não vamos conseguir isso com discursos formais ou trancados em palácios.
Peço a esta Folha e à mídia brasileira que cubram o evento e espalhem a informação de que a luta contra a Aids continua, ape- sar de todos os avanços (e o Bra- sil, orgulhosamente, é dos que mais avançaram).
Não se trata de passar pânico, mas ponderação, cuidado, prevenção.
Não se trata de incitar uma cruzada moral. Mas, respeitando todas as culturas e formas de ser, pregar a prevenção e o engajamento.
E lembrar que a Aids não morreu.

NIZAN GUANAES, publicitário e presidente do Grupo ABC, escreve às terças, a cada 15 dias, nesta coluna.

AMANHÃ EM MERCADO:
Mario Mesquita


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