São Paulo, sábado, 31 de julho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Flip vai à Academia

Festa de Paraty homenageia pela primeira vez autor de não ficção, reduz presença de escritores, povoa mesas de acadêmicos e acende controvérsia sobre renovação

FABIO VICTOR
DE SÃO PAULO

Veterano da Festa Literária Internacional de Paraty -esteve em todas as edições, em três delas como convidado ou mediador-, o escritor e agitador cultural Marcelino Freire desta vez vai faltar.
"Parece uma festa que não nos pertence mais", diz, referindo-se aos escritores.
"Sempre fui um entusiasta da Flip, mas, com FHC abrindo e um monte de mesas sobre [o homenageado] Gilberto Freyre, está esquisito."
Na próxima quarta à noite, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fará a conferência de abertura da Flip, que se estende até o domingo seguinte e celebra o sociólogo pernambucano.
Freyre é o primeiro autor de não ficção a ser homenageado em Paraty, o que se reflete na composição das mesas: dos 34 convidados para esta oitava edição, só 16 se dedicam à literatura, menos da metade. Jamais a Flip reuniu tão poucos ficcionistas.
Do mundo acadêmico, predominam historiadores (seis), mas estarão lá também, sociólogos, críticos/ensaístas, um antropólogo etc.

PROVOCAÇÃO
No twitter, Marcelino Freire escreveu: "(...) Quem tem saco para ouvir FHC falando de Gilberto Freyre? A Festa tucanou?". Ele diz que a menção partidária foi só provocação e que não crê em contaminação política da festa. O problema, sustenta, "é uma certa preguiça" na escolha dos convidados brasileiros. "Por que Glauco Matoso nunca foi à Flip? Roberto Piva morreu sem ter ido à Flip. Por que Nelson de Oliveira nunca foi, e FHC vai? Preferia Paulo Coelho a FHC", provoca.
A escritora Ivana Arruda Leite endossa as críticas. "Não vou [a Paraty] e me junto ao Marcelino, com exceção [da crítica à escolha] do FHC, que mora no meu coração. Meu problema é com essa abertura para todo mundo, menos para escritores, muito menos brasileiros."
Dos sete autores de ficção nacionais convidados, seis já tinham participado antes -a exceção é Carola Saavedra.
Convidado em 2004, Cristóvão Tezza vê a Flip como "um fenômeno transliterário". "Pensar que a literatura é um nicho impermeável à história, à sociologia, a aspectos filosóficos é uma ideia miúda da literatura."
Tatiana Salem-Levy, convidada em 2009, concorda parcialmente com o colega.
"Eu me interesso por Freyre e não acho [a programação] ruim, tenho um pé na academia. Mas talvez faltem novos escritores brasileiros, não sei por que eles não levam outros. É uma questão."
Para o diretor de programação da Flip, Flavio Moura, o espaço aberto para acadêmicos e ensaístas é natural. "Propus-me a fazer uma homenagem consistente, a mais densa possível, e é claro que ao fazer isso tive menos mesas para jogar. É uma opção de curadoria", diz.
Moura rejeita a queixa sobre a renovação de convidados nacionais. "Três dos principais livros brasileiros recentes estão ali, são de Reinaldo Moraes, ("Pornopopéia"), Ronaldo Correia de Brito ("Galileia") e Beatriz Bracher ("Antônio"). Não vou deixar de chamar uma pessoa interessante só porque ela já foi à Flip."
Tanto ele quanto a cocuradora da homenagem, Maria Lucia Pallares-Burke, ressaltam o viés literário da obra de Freyre, foco de uma mesa.
Pallares-Burke acrescenta que se preocupou em não chamar só especialistas, mas intelectuais de outras áreas que querem dialogar com as ideias de Freyre.
Em sua primeira edição, em 2003, a Flip convidou majoritariamente escritores -eram 18 entre os 23 participantes. Ao longo dos anos, abriu-se mais para convidados das variadas ciências humanas e de outras artes.


Texto Anterior: Mônica Bergamo
Próximo Texto: Livros: "Piauí" reúne em livro a nata de seus perfis políticos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.