São Paulo, domingo, 05 de junho de 2005

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O ativista

Einstein também foi um grande ator na política do século 20; ao mesmo tempo em que alertou os EUA para o potencial das armas nucleares, foi perseguido pelo FBI por militar contra o macartismo e o racismo

O militante que ergueu sua voz contra o nazismo e a caça aos comunistas

Olival Freire Jr.
Especial para a Folha

A imagem pública de Einstein fica incompleta sem sua atividade política. Parte dessa atividade é relativamente conhecida -em especial a carta ao presidente Roosevelt, em 1939, pedindo que os EUA se adiantassem na construção da bomba atômica, antes que Hitler o fizesse. Menos conhecido é o seu papel na época em que a sociedade americana foi tomada pela histeria anti-comunista do macartismo.
O substantivo histeria não é casual: parcelas influentes das elites americanas foram tomadas por um espírito irracional na época, especialmente depois que a União Soviética detonou sua primeira bomba atômica, em 1949. O alvo da histeria era o próprio cidadão americano, posto sob suspeita de estar colaborando com o inimigo soviético. Muitos perderam o emprego, outros se exilaram. O casal Julius e Ethel Rosenberg foi condenado à cadeira elétrica em 1953, sob acusação de ter revelado aos russos o segredo da bomba.
O apelo de Einstein para a construção da bomba atômica tem sido objeto de controvérsia. Afinal, ele foi contra a 1ª Guerra e manteve uma posição pacifista ao longo de toda a década de 1920. Como entender que ele tenha adotado uma posição de conseqüências tão trágicas para a história?
A carta não pode, entretanto, ser julgada com os olhos de hoje. Einstein abandonou o pacifismo depois da ascensão do nazismo na Europa e sustentou que as nações democráticas deviam se preparar para a eventualidade da agressão nazista. Os físicos sabiam que, depois da descoberta da fissão nuclear, a Alemanha poderia ser a primeira a construir a bomba.
Quanto ao macartismo, a história desse período nos EUA é também a história da resistência ao ambiente político dominante, e aqui Einstein desempenhou um papel significativo. Procurado por William Frauenglass, um professor de inglês que havia sido demitido após ter se recusado a comparecer perante a comissão de caça aos comunistas presidida pelo senador Joseph McCarthy, Einstein enviou-lhe uma carta na qual sugeria o caminho da não-cooperação, adotado por Gandhi, na Índia, contra os britânicos.
A carta afirmava que "todo intelectual intimado por um desses comitês deveria se recusar a testemunhar, isto é, ele deve estar preparado para a prisão e para a ruína econômica, em suma, para o sacrifício de seu bem-estar pessoal, no interesse do bem-estar cultural do país". Einstein concluiu a carta afirmando que ela não precisava ser considerada "confidencial". Publicada no jornal "The New York Times", a carta se transformou num símbolo da resistência ao macartismo.
Einstein foi também solidário com o físico David Bohm, que, perseguido pelo macartismo, se exilou no Brasil. Escreveu para professores da USP e para Getúlio Vargas. Com o apoio de Einstein e dos brasileiros, Bohm trabalhou na USP por mais de três anos.
Einstein também adotou posições públicas contra o racismo. Ele foi solidário com o historiador W. E. B. Du Bois e manteve uma duradoura amizade com o atleta, cantor e ativista Paul Robeson, negros e vítimas de perseguição.
Os biógrafos de Einstein subestimaram essa história, que só foi resgatada recentemente, no livro "The Einstein File", escrito pelo jornalista Fred Jerome com base no dossiê do FBI sobre o físico.
O dossiê revela que Einstein tinha inimigos nos EUA, antes mesmo de emigrar para o país, e que o todo-poderoso chefe do FBI, Edgar Hoover, planejou, sem sucesso, desencadear um processo para expulsá-lo dos Estados Unidos, acusando-o de espionagem para os soviéticos. O dossiê, de acesso público (foia.fbi.gov/foiaindex/einstein.htm) é o resultado desse plano.


Olival Freire Jr. é pesquisador do Instituto Dibner para a História da Ciência, no MIT (Estados Unidos), e da Universidade Federal da Bahia


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