São Paulo, terça-feira, 22 de julho de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Respirar fundo


O Brasil precisa se preparar tanto para um cenário de inflação global como para possível recessão com deflação

FAZIA MUITOS anos que a economia mundial não vivia um momento tão angustiante como o atual. A atividade geral cai seguidamente nos países desenvolvidos, ao mesmo tempo em que a inflação sobe a níveis ameaçadores. Isso coloca os condutores da economia em um grande dilema: seria melhor concentrar mais esforços para evitar a recessão ou para combater a inflação?
O principal instrumento de combate à inflação são as taxas de juros. Mas, se elas forem aumentadas pelos bancos centrais, as chances de recessão crescem exponencialmente, com a volta do desemprego e de tensões sociais. Se, por outro lado, a decisão for pelo estímulo à produção, com expansão de crédito e outros mecanismos desenvolvimentistas, a inflação pode disparar, destruindo riquezas e punindo principalmente a população mais pobre.
Por mais que os países emergentes tenham assumido posição relevante no cenário mundial, o principal protagonista desse enredo são os EUA. Até agora, o presidente do Fed (banco central americano), Ben Bernanke, tomou partido dos que querem o combate à recessão. Desde que explodiu a crise do "subprime" nos EUA, em agosto do ano passado, o Fed já reduziu a taxa de juros em três pontos percentuais, de 5% para 2% ao ano. Se já não tivesse sido deliberadamente explícito a respeito de sua opção, só essa seqüência de cortes de juros já seria suficiente para mostrar de que lado está.
A crise do "subprime" ainda não foi debelada. Na semana passada, o governo americano foi obrigado a fazer um resgate bilionário das duas maiores instituições de crédito imobiliário dos EUA, Fannie Mae e Freddie Mac. Mesmo assim, é preciso reconhecer que a estratégia de Bernanke vem dando resultado. Já se vai um ano desde o início da crise do "subprime" e o mundo não entrou em recessão. As projeções atuais indicam que a economia global ainda vai crescer 2,9% neste ano, e a dos EUA, 1,5%. O comércio mundial também vai se expandir: 4,5% em 2008, nível bastante razoável, embora bem inferior aos 5,5% do ano passado e aos 8,5% de 2006.
O momento atual exige uma boa dose de coragem dos condutores da economia, tanto lá fora como aqui.
No lugar deles, eu respiraria fundo, como pediu o presidente Bush aos americanos, e poria um pouco mais de ênfase na manutenção do crescimento. Doses exageradas de ortodoxia monetária, aplicadas por causa do medo, podem ter efeitos colaterais desastrosos.
Há o risco de que a escalada dos juros seja iniciada pelos bancos centrais exatamente no momento em que começa a murchar a bolha das commodities, com a redução de preços do petróleo e outras matérias-primas. Alguns analistas já alertam para a possibilidade de uma deflação mundial generalizada caso a ortodoxia monetária volte a dar as cartas. A deflação é uma praga tão sinistra quanto a inflação, porque leva o consumidor a adiar sua decisão de compra, à espera de que os preços sejam menores no futuro. Com isso, a demanda desaba e a estagnação/recessão é longa. Alguns anos atrás, o Japão e alguns países europeus sofreram com a deflação a ponto de clamarem aos céus por aumentos de preços.
O Brasil, nessa situação de sinuca mundial que deixa sem rumo até os bancos centrais dos países ricos, precisa se preparar tanto para um cenário de inflação global como para uma possível recessão com deflação.
Nenhum dos dois é agradável. No primeiro, nossas exportações cairiam pela redução da demanda mundial. No segundo, elas seriam fortemente atingidas pela redução dos preços das commodities. O melhor é cruzar os dedos na espera de um cenário intermediário.


BENJAMIN STEINBRUCH, 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
bvictoria@psi.com.br



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