São Paulo, quinta-feira, 30 de julho de 2009

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ANÁLISE

O calendário da gripe

Dados mostram que a aposta das autoridades, de adiar a volta dos estudantes às aulas, é razoável

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Em termos abstratos, a decisão de algumas secretarias estaduais de Saúde de adiar a volta às aulas seria difícil de justificar. O novo vírus A (H1N1), afinal, não parece especialmente letal nem há indícios de que crianças e adolescentes constituam grupo que corre riscos desproporcionais de desenvolver quadros graves da moléstia, como é o caso das grávidas.
Assim, em condições normais, nada recomendaria alterar o calendário.
Quando se trazem fatores locais para o cálculo, porém, a situação pode mudar de figura. Para começar, o custo da mudança é relativamente baixo. Exceto por alguns casos especiais como o dos estudantes que farão o Enem e o vestibular ou de pais que não têm com quem deixar seus filhos, as duas semanas perdidas agora podem perfeitamente ser compensadas nas férias de verão. O número de dias de aula não precisa sofrer nenhuma redução.
Do lado dos ganhos, a conta é mais complicada, pois envolve várias incógnitas. O raciocínio por trás da medida é que o adiamento fará com que a volta às aulas ocorra sob condições mais propícias, quando já tiverem passado o pico epidêmico e o clima frio que favorece a transmissão do vírus.
Em relação ao momento epidêmico, a aposta das autoridades é razoável. A crer na experiência mexicana, o número de casos da H1N1 começa a declinar de quatro a cinco semanas após a explosão inicial. Seria um cenário favorável para o RS e SP -onde o surto epidêmico já estará completando um mês-, e mais incerto para o RJ.
A dúvida é se o modelo mexicano pode ser transposto para o Brasil. Lá, o H1N1 chegou após a estação gripal; aqui, durante.
No que diz respeito ao clima, a incerteza é ainda maior. Embora agosto seja tipicamente mais quente do que julho, não há nenhuma garantia de que as tendências de longo prazo se materializarão neste ano.
Outro fator a considerar é a umidade. O vírus encontra condições ideais de propagação com o clima seco (umidade relativa entre 20% e 35%). Pelo menos em SP, este mês de julho anormalmente chuvoso ajuda a conter o surto. Daqui a duas semanas condições mais secas podem voltar a preponderar.
Embora os ganhos potenciais sejam incertos, a aposta das autoridades parece mais justificável quando se considera que as crianças representam um importante elo de transmissão do vírus. A primeira avaliação científica do H1N1, feita no México, apurou uma taxa de ataque clínico (infecção) de 29% para a população de mais de 15 anos e de 61% para os menores.


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