São Paulo, domingo, 17 de maio de 2009

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700 mil vivem em área ilegal em Guarulhos, diz governo

Prefeitura não confirma o número e afirma que tenta resolver problema

Falta de planejamento urbano e crescimento intenso deflagraram ocupações irregulares a partir da década de 1970

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"A gente está dormindo e é rato andando por cima da gente", conta Ângela Quitéria, 43, com o olhar voltado para o chão do barraco em Hatsuta, favela com esgoto a céu aberto no centro de Guarulhos (região metropolitana de São Paulo). Os barracos margeiam a calçada da avenida Tancredo Neves e se estendem pela estrutura desativada da antiga fábrica de equipamentos agrícolas Hatsuta, fechada nos anos 1990.
Quando chegou de Alagoas, ela, o marido e os filhos sentaram nas malas, na calçada, "esperando a sorte". "Uma pessoa que morava aqui passou e disse: "Tem um lugar desativado, com gente morando. Por que vocês não vão para lá?'"
Na época, havia seis famílias; hoje, há 430. Muitos vivem da reciclagem, o que faz com que o local concentre pilhas de lixo, por onde as crianças brincam. "Estou louca para sair daqui."
Semelhantes à Hatsuta há mais 378 áreas precárias ocupadas, onde moram 231 mil pessoas, segundo a prefeitura. Loteamentos irregulares -terrenos cujos antigos donos não fizeram regularização junto à prefeitura- somam 241.
Segundo o governo do Estado, Guarulhos é a cidade paulista com mais população em áreas irregulares -são 700 mil, de um total de 1,2 milhão de habitantes. A prefeitura local não confirma os números.
O crescimento intenso -principalmente nos anos 1970 e 1980, devido à expansão industrial e à construção do aeroporto-, aliado à falta de planejamento urbano, criou ocupações no entorno do aeroporto, de áreas de mananciais e de proteção ambiental.
No Jardim Fortaleza, por exemplo, Maria Alice, 31, colhe mandioca, café, laranja -que o pai plantou, nos anos 1990, na encosta da serra da Cantareira. "Quando a imobiliária veio, para abrir caminho para os loteamentos, pôs meu pai aqui em cima." De casa, ela vê os 150 loteamentos e ocupações irregulares sobre a mata atlântica.
Em área de manancial há 20 anos, Eduardo Perreira, 69, reclama que o "rio valente" -Baquirivu, sub-bacia do Tietê- já tragou móveis, barracos e até um "pé de abacate", em chuvas passadas. Um dos primeiros a chegar ali, viu a população aumentar e a criação de duas penitenciárias e dois centros de detenção, que trouxeram o rio mais para perto. "Eu sei que estamos em área de risco, mas o que podemos fazer, moça?"
A Secretaria de Habitação de Guarulhos diz que está urbanizando, com recursos federais, áreas ocupadas por 31 mil famílias e que pretende entregar 700 moradias até o fim do ano -mais 500 até o fim de 2010. Entre 2001 e 2008, 1.500 famílias foram removidas para conjuntos da CDHU, em parceria com o governo do Estado.
Sobre a Hatsuta, disse que, por ser área dada como garantia a empréstimo federal -que, após 17 anos de pendência, continua sem dono-, não há "possibilidade" de intervir e aconselha os moradores a se cadastrarem no programa federal "Minha Casa Minha Vida", que prevê construção de 400 mil moradias para a baixa renda.
Sobre o Jardim Fortaleza, diz que há ação do Ministério Público contra os proprietários para recomposição da área. Para a favela do Baquirivu, afirma negociar parceria com a CDHU para 2010. (NATÁLIA PAIVA)


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