São Paulo, sábado, 27 de setembro de 2008

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Entrevista Soninha Francine

Soninha critica a Câmara e diz que não apoiará ninguém no 2º turno

Vereadora admite que seu programa é criticado pelos que a cercam, mas é adorado "no fundão de Guaianazes"

ANA FLOR
DA REPORTAGEM LOCAL
RANIER BRAGON
EM SÃO PAULO

Ela reconhece que só um milagre a levará ao segundo turno.
Mas antecipa: não apoiará nenhum dos que sobreviverem à disputa. Soninha Francine (PPS), 41, com 4% das intenções de voto, segundo o Datafolha, já tem planos para o pós-5 de outubro, caso ela não seja escolhida: "Vou sumir".
A vereadora enumera críticas ao PT, seu ex-partido, ao DEM e ao PSDB, mas elogia muito o governador José Serra (PSDB). Admite que a qualidade do seu programa eleitoral é criticada pelos que a cercam -"mas lá no fundão de Guaianazes as pessoas adoram"- e se diz decepcionada com a Câmara Municipal. A ponto de dizer que escreverá um "catálogo da desonestidade, de A a Z".

 

FOLHA - O voto de quem você procura?
SONINHA FRANCINE
- Do eleitor desiludido, de quem já não bota muito mais fé, não se conforma com o estado das coisas, pensa coletivamente, na cidade, mas não bota mais fé na política para mudar as coisas. Gente cansada das promessas algodão doce... [tipo] "já fizemos muito, te darei o céu", mas também já cansaram do discurso contra tudo e contra todos.

FOLHA - Ivan Valente diz que suas propostas não são do PPS, mas suas.
SONINHA
- Então por que o PPS me escolheu para candidata?

FOLHA - Porque não tinha outro...
SONINHA
- Não precisava ter, nunca teve antes. Quis disputar esta eleição justamente por que queria ter uma candidata como eu, por isso me convidou. Uma das coisas que me atraiu ao PPS foi o PPS se reconhecer em São Paulo como um partido quase invertebrado.

FOLHA - Você é a espinha dorsal do PPS hoje?
SONINHA
- Sim, sem dúvida. Hoje sou. Cheguei e sentei na janelinha. Em São Paulo.

FOLHA - Você acredita que vai ao segundo turno?
SONINHA
- Seria quase um milagre. Ele pode acontecer.

FOLHA - Não indo ao segundo turno, quem você apoiará?
SONINHA
- Nenhum dos quatro à minha frente. (...) O PPS, nas últimas eleições, esteve ao lado do PSDB. Para mim, apoiar o PSDB em uma eleição? Saí do PT, me desiludi com o PT, mas daí a apoiar o PSDB ou o DEM?
Vou respeitar a decisão do meu partido, não vou bater de frente, mas não vou gravar apoio na televisão. Eu vou sumir entre o primeiro e o segundo turno, se não for eu a candidata. Vou voltar para a Câmara, tenho milhões de coisas para fazer.

FOLHA - Por que não apoiar?
SONINHA
- O DEM, porque não tenho nenhuma identificação ideológica. O PT e o PSDB, porque têm defeitos muito parecidos. Defeitos do tipo que me levaram a sair do PT. O PSDB também tem, que é abraçar o vale-tudo para derrotar o adversário. Vale qualquer tipo de coligação, torturar os números até que eles digam o que você quer que digam. Não suporto isso, não suporto ver o horário eleitoral do PT e do PSDB.

FOLHA - O do DEM não tem isso?
SONINHA
- O Kassab está se portando mais cavalheirescamente, de modo geral, no horário eleitoral. Menos golpes abaixo da cintura, mas tem também os dele, como prometer que não vai aumentar a passagem. Tem medidas na prefeitura, como essa ampliação oportuna do bilhete único para três horas, o que na verdade é parcial, porque não atendeu a estudante e o vale-transporte.
Também tem golpes baixos.

FOLHA - Cansada do Legislativo, aceitaria ser secretária de governo?
SONINHA
- Acho muito difícil.

FOLHA - Você foi procurada para ser vice?
SONINHA
- O partido foi, mas ninguém nunca falou comigo diretamente. O partido em nenhum momento balançou.

FOLHA - Você teria balançado?
SONINHA
- De jeito nenhum. A graça de disputar a prefeitura, além do objetivo de ser prefeita um dia, é demonstrar uma outra maneira de ler a cidade, de ler a política e de fazer política. Isso seria completamente impossível em uma candidatura tucana ou democrata. Eu faria questão de escrever o meu texto do horário eleitoral.

FOLHA - Esse texto está tento receptividade, você em pé, falando?
SONINHA
- Entre meus pares, jornalistas, comunicólogos, especialistas em mídia e marketing, não. Falam que o programa é pobre, é equivocado, que precisaria concentrar mais o discurso em dois ou três temas, e ficar só com eles, que é texto demais, que eu falo muito rápido, as pessoas não entendem. Esse é o retorno do meu grupo. Agora, lá no fundão de Guaianazes, as pessoas adoram.

FOLHA - Não acha que o tom é professoral, infantil até? SONINHA - As pessoas da nossa categoria assim entendem, as outras não. (...) O povão, a classe C, D e E, saca que não é tática de conquista de eleitorado, que é a exposição de uma crença.

FOLHA - Se arrependeu da frase sobre negociatas?
SONINHA
- Não. É totalmente coerente com minha vida lá nestes quatro anos. É proibido criticar os colegas. É tão proibido que é quase constrangedor dar parecer contrário a pareceres de colegas nas comissões.
(...) Aprovação de projeto é sempre com acordo. Acordo implica em uma troca, e a troca pode ser razoável, ou pode ser...

FOLHA - Acordo ilegítimo?
SONINHA
- Às vezes ele é ilegítimo. Eu questiono a legitimidade do próprio modelo. Quer dizer que não importa se o projeto é bom, ruim, urgente, ou de menor relevância, o que importa é se os autores acordaram?

FOLHA - Desiludida com a Câmara?
SONINHA
- Iludida eu nunca estive, mas eu consegui me decepcionar...

FOLHA - Conseguiu mexer com alguma coisa?
SONINHA
- Consegui. Pelo menos dar visibilidade da Câmara ao público em geral. Porque certas vezes dar um voto contrário, que não muda o resultado da votação, muda a visibilidade daquela sessão. "Ué, por que um voto contra?" Às vezes menos do que eu gostaria. Eu fui a única vereadora que registrou o voto contrário no atual presidente da Câmara [Antonio Carlos Rodrigues, do PR]. A primeira eleição para presidente da Câmara foi de uma tensão absurda. Naquela noite, eu tive o sonho, a alegoria, mais ridícula da minha vida. Sonhei que estava me debatendo em uma piscina de merda, só com a cabeça para fora. Foi na noite seguinte à eleição da Mesa Diretora, primeiro dia de vereadora.

FOLHA - Por que não votou no atual presidente da Câmara?
SONINHA
- Porque o modo como ele vê a política, o Legislativo, as relações do Legislativo com o Executivo, com o eleitorado, com a mídia, em nada combina com a minha. O que posso dizer que admiro no Antonio Carlos Rodrigues é a sinceridade. Porque ele bota o dedo no nariz e diz: "Vou para cima de você". Ele já disse em entrevista que eu estava sofrendo boicote, sim, em represália ao fato de não ter votado nele.

FOLHA - O catálogo da desonestidade de A a Z será baseado na experiência na Câmara? Cite exemplos.
SONINHA
- Vai ser. Um: o vereador apresentar um projeto muito interessante do ponto de vista do interesse público que ele não tem o menor interesse em botar em votação. Ele vai para sempre ostentar o projeto no seu currículo, mas ele nunca vai indicar aquele como o seu projeto do acordo para ser votado em plenário. Outro: fingir que ignora as verdadeiras intenções por trás de uma determinada postura. (...) Esse fingir que ignora o que está por trás de um acordo, de um determinado encaminhamento, foi uma forma nova de desonestidade que aprendi.

FOLHA - Há chance de você assumir a prefeitura e se desiludir no 1º dia?
SONINHA
- Acho que eu já conheci o pior possível. Qual é o pior possível? São as pessoas que têm uma história parecida com a sua, ou de enfrentamentos tensos em nome da sua crença, [pessoas] que eu admirava....Fazerem isso.

FOLHA - Você passou a admirar pessoas que estavam do outro lado?
SONINHA
- Sim, basicamente o [José] Serra.

FOLHA - Ele foi um estímulo para você concorrer, ou incentivou você?
SONINHA
- Não, muito pelo contrário. Mas ao mesmo tempo que tem pessoas que eu admirava que me chocaram, pelo que elas chamam de pragmatismo, de "política é assim mesmo". A pessoa de quem eu tinha uma impressão horrível e hoje eu admiro muito é o Serra. E isso para o PT é a morte.

FOLHA - Você discutiu com ele a idéia de concorrer?
SONINHA
- Com ele e com todos os meus amigos.

FOLHA - Ele é um amigo?
SONINHA - É um amigo.

FOLHA - Ele apóia o Kassab?
SONINHA
- A gente não pode falar em nome dele. É muito meu amigo, mas a gente não comenta. Muitos tucanos teriam escolhido o Kassab como candidato da chapa do PSDB. Possivelmente o Serra também.

FOLHA - E suas prioridades?
SONINHA
- A principal é a reconfiguração da distribuição de atividade econômica e moradia da cidade. Na educação e na saúde há duas medidas de emergência, como se fossem pós-Katrina, "mutirão para tirar atraso". Atraso na educação é a defasagem de ter adolescentes que não sabem ler. Soem as sirenes! Chamem helicópteros e a ONU! Para onde vai essa molecada? Eu vou fazer isso no ano que vem, se eu não for prefeita. Vou chamar as forças de paz, a Cruz Vermelha, a Crescente Vermelha. Cada bairro adota uma escola. Na saúde, essa coisa de seis meses por um exame, vamos fazer mutirões.


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