São Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2007

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Gravação da PF sugere doação de R$ 500 mil da Cisco ao PT

Diálogo interceptado indica que empresa buscaria benefício em licitação da Caixa

Polícia vai apurar teor da conversa em outra etapa do trabalho de investigadores da Operação Persona, que mira multinacional dos EUA

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Durante a investigação da Operação Persona, que apontou um prejuízo de R$ 1,5 bilhão aos cofres públicos, a Polícia Federal gravou conversas telefônicas entre empresários do setor de informática que relatam uma "doação" de R$ 500 mil ao PT. Os interlocutores sugerem que o dinheiro seria uma contrapartida para algum tipo de benefício numa licitação da Caixa Econômica Federal.
Segundo apurou a Folha, a informação consta no relatório preparado pela Polícia Federal, que investigou durante dois anos o suposto grupo criminoso. Na semana passada, foram presas 42 pessoas acusadas de formação de quadrilha, sonegação fiscal, descaminho e corrupção de agentes públicos, entre outros crimes.
As referências à palavra "doação", conforme documento da PF, partem do fundador da Cisco do Brasil, Carlos Carnevali, e de executivos da Mude Comércio e Serviços Ltda., apontada como a importadora oculta da Cisco -Francisco Gandin, José Roberto Pernomian e Fernando Grecco.
Num dos trechos do relatório, a PF informa que Grecco conversa com Pernomian, ambos da Mude, para "acertarem valores e datas do negócio de Carlinhos Carnevali com um representante do PT". Em outro momento, a polícia relata um diálogo entre Carnevali e Gondin, em que este cita negócios entre o fundador da Cisco e a Caixa. Não há no documento referência ao nome do suposto contato do PT com os executivos da Cisco e da Mude.
No Tribunal Superior Eleitoral também não existe qualquer registro de doação da Cisco ou de Carnevali a petistas.
Carnevali e Pernomian estão presos na PF em São Paulo.
A Folha apurou que a PF ainda não abriu uma investigação para apurar a suposta existência da "doação" nem em relação à eventual interferência em uma licitação da Caixa. O teor dos diálogos será alvo de uma segunda etapa do trabalho dos investigadores que atuaram na Operação Persona.
Existe a suspeita de que o grupo de investigados, com a Cisco e a Mude à frente, tenha montado um esquema de fraudes com ramificações pelo serviço público. Na Operação Persona, ao menos sete auditores da Receita Federal foram citados como envolvidos no esquema de sonegação de imposto.
Por meio da assessoria de imprensa, a PF informou que não se pronunciaria sobre o assunto porque é parte de um relatório da Operação Persona que está sob segredo de Justiça.
Na composição executiva da Caixa, a atual presidente é Maria Fernanda Ramos Coelho, filiada ao PT de Pernambuco, e a vice-presidente de Tecnologia da Informação, Clarice Coppetti, tem longa trajetória no PT gaúcho. Coelho assumiu a presidência em 2006, no lugar de Jorge Mattoso, numa das maiores crises do banco.
Mattoso deixou o cargo no escândalo da quebra ilegal de sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, que em depoimento à CPI dos Bingos afirmou que o então ministro da Fazenda Antonio Palocci freqüentava uma casa em Brasília na qual eram feitos acertos para pagamentos de propina.
Multinacional de origem americana, a Cisco domina cerca de 80% do mercado de equipamentos de informática no Brasil. Indiretamente, ou seja, por meio de empresas que só comercializam seus produtos, fornece material, por exemplo, para a Receita, que atuou na investigação que revelou o esquema de fraudes montado pela parceria Cisco/ Mude.
Segundo a investigação da PF, da Receita e do Ministério Público, Cisco e Mude montaram uma cadeia de empresas nos EUA e no Brasil para introduzir no país produtos de informática com preços até 70% mais baixos que a média do mercado. Nos últimos cinco anos, segundo a Receita, os envolvidos deixaram de recolher R$ 1,5 bilhão em impostos, usando notas frias, subfaturamento de importados, "laranjas" e "offshores"


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