São Paulo, sábado, 09 de janeiro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Jobim vai cobrar de Lula a revisão do programa

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, vai se reunir na semana que vem com o presidente Lula para revisar o terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos. Jobim quer que a futura comissão da verdade possa, em tese, investigar os dois lados envolvidos, o da repressão e o da esquerda armada, mas há resistência das pastas da Justiça e Direitos Humanos.
O plano, que encontra fortes reações também na Igreja Católica, no setor ruralista, e de entidades de comunicação, se tornou o principal e mais complexo problema político de Lula no início de 2010, ano da campanha sucessória.
O presidente se comprometeu com Jobim a promover a revisão numa conversa dos dois na Base Aérea de Brasília no dia 22 de dezembro, um dia depois do lançamento oficial do plano e em meio à ameaça de demissão dos comandantes das Forças Armadas. No dia seguinte, o ministro comunicou a decisão a eles, que aguardam a concretização do acordo.
A área política do governo, porém, duvida da revisão e teme que o problema se desloque de lado: o principal responsável pelo plano, o ministro de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, é quem poderia pedir demissão. Ao mesmo tempo em que prometeu mudar os pontos que geram tensão entre os militares, Lula não quer perder apoio de uma área tão forte, em um ano eleitoral.
A proposta original de Jobim, depois de ouvir Exército, Marinha e Aeronáutica, era a criação de uma comissão da verdade e da reconciliação, seguindo o modelo da África do Sul. Ele e os militares reclamam que Vannuchi não acatou nenhuma das sugestões da área militar.
Há duas opções para mexer na diretriz 23, do 6º capítulo, que fala em violações de Direitos Humanos "praticadas no contexto da repressão política" da época da ditadura militar (1964-1985). Como está, prevê apuração só de torturas praticados por militares. Jobim defende que haja abertura para investigar também assaltos a bancos, sequestros e mortes promovidos pelos militantes da esquerda armada.

Mudanças
Há duas formas possíveis para isso. Ou o texto passa a falar em violações praticadas "no contexto de conflitos políticos e da repressão política", ou a se referir diretamente a "violações de Direitos Humanos ocorridas no Brasil", sem indicar quem as teria cometido.
Conforme a Folha apurou, o Ministério da Defesa concluiu que não adianta Lula empurrar o desfecho para abril, quando o projeto de lei que irá instituir a comissão faria o ajuste. Como o plano é um decreto presidencial, um projeto de lei não tem força legal para revogá-lo.
Jobim também está negociando a revisão de dois outros pontos do plano com Lula. Um deles é o que prevê que comitês estaduais identifiquem e cataloguem instalações militares que abrigaram tortura durante a ditadura. O outro ponto é a intenção de tirar o nome de ex-presidentes militares, como Castello Branco, Costa e Silva e Emílio Médici, de locais públicos como pontes e viadutos.
A crítica é que ambos têm "viés stalinista". O temor é que incitem uma onda de civis contra prédios e oficiais militares.
Para o Ministério da Defesa e para os militares, porém, os críticos estão fazendo confusão entre a comissão da verdade e a revisão da anistia.
Na avaliação deles, o programa não implica a revisão da lei que anistiou todos os lados, até porque o segundo item da própria diretriz 23, que trata das atividades da comissão, manda observar "as disposições da Lei 6683, de 28.08.1979" -que é, justamente, a Lei da Anistia. Trata-se do reconhecimento de sua legitimidade.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Com 521 metas, plano é vago e controverso
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.