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03/05/2007 - 10h41

Cuba: Cápsula do tempo, Havana vive espera por mudanças

LUCIANA COELHO
da Folha de S.Paulo, em Cuba

Abstraia o tempo. A primeira impressão que se tem ao desembarcar em Cuba é que ali ele paira em suspenso. Nos relógios, no calendário e principalmente na vida das pessoas.

A "ilha do dia anterior", como a chamou o jornalista e escritor americano Jon Lee Anderson, tem ritmo próprio, encapsulada numa época que já não há.

Os anos de triunfo da revolução --aquelas duas décadas que seguiram a tomada do poder por Fidel Castro, em 1959-- estão cristalizados sobretudo na capital. Nos museus de um nacionalismo quase ingênuo (o Museu da Revolução, apesar do quê de feira de ciências escolar, explica muito sobre o país). Nas praças repletas de livreiros com suas conversas cheias de política e história.

Nas escolas de portas abertas para as ruas para que os transeuntes vejam que tipo de educação estão recebendo os pequenos cubanos. Nos carros rabo-de-peixe que desafiam incólumes a era dos bens descartáveis. Nas ruas de paralelepípedos e casas recém-pintadas num impulso para atrair mais turistas nos últimos dez anos convivendo ao lado de cortiços dos quais saem crianças aos borbotões e onde adultos comentam o último capítulo da novela (brasileira). E na conversa das pessoas.

Da mesma forma, estão cristalizadas aí as misérias advindas da combinação do embargo econômico imposto pelos EUA com o colapso soviético no início dos anos 90 (vinha da ex-URSS a principal injeção de recursos para o país). Mazelas condensadas pelo isolamento do mundo que o regime impõe aos cubanos, sem referencial do que é melhor e do que é pior que a vida que levam.

Reticências

Da atmosfera decadente dos bares e restaurantes de Centro Havana e dos cortiços que observam o mar no Malecón, o calçadão que cobre boa parte da orla da cidade, aos casarões coloniais de Havana Velha com suas ruas estreitas lotadas de turistas, tudo parece em compasso de espera por uma mudança iminente. Tudo parece suspenso. Tudo parece na iminência de se dissipar.

As frases que saem das conversas com habaneros terminam invariavelmente em reticências. Eles dizem que, uma vez morto Fidel, nada, ou muito pouco, mudará em suas vidas.

Mas é difícil crer, por exemplo, que a fábrica de charutos Partagás, fincada no centro da cidade e aberta à visitação, continuará a usar exclusivamente seu modo de produção artesanal, onde cada um dos "puros" é confeccionado por uma mesma pessoa, da escolha das folhas de tabaco à colocação do anel com a logomarca. A visita é elucidativa não só pelo prazer de ver a produção do mais célebre produto do país (ao lado do rum), mas pela conversa com o guia.

Alfredo, na casa dos 40 anos, formado em marketing, topa conversar após encerradas as explicações sobre charutos. "Estão todos esperando uma mudança. Mas será uma mudança lenta, como tudo em Cuba. Talvez uma abertura comercial como a chinesa. Mas não na estrutura do poder", diz, olhar atento a quem o ouve.

O guia --como taxistas e funcionários de hotéis-- é o que pode ser chamado de uma "classe média" cubana. Sim, ela existe, e vive no arborizado bairro de Vedado, com seus cinemas, sorveterias e clubes de jazz, onde as casas são espaçosas e sofisticadas, mas parece não terem sofrido uma reforma desde os anos 50.

Os bairros mais ao norte, mais modernos, com seus hotéis recém-construídos de redes internacionais, experimentam com mais força ainda o impacto desse miniboom. Restaurantes e clubes mais sofisticados, carros de luxo, casas novas e um pequeno grupo de cubanos que convive mais com os estrangeiros do que com seus conterrâneos.

Ganham dinheiro graças à indústria turística, com seus "pesos conversíveis". Um peso conversível equivale hoje a um euro, ou a 26 pesos cubanos --a "divisa nacional" que os cubanos recebem no contracheque e usam para pagar a comida e os produtos do dia-a-dia (salário mínimo: 260 pesos).

Os pesos conversíveis são para turistas e também para os cubanos que quiserem comprar produtos mais sofisticados ou entrar em um clube ou danceteria da moda. Como ficará essa dupla economia quando não houver mais o comandante é uma incógnita.

 

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